terça-feira, 29 de outubro de 2013

A HISTÓRIA DE LOBO

Achamos a história muito boa, por isso queremos compartilhá-la com vocês!
 
fonte: agiliteiros.com; Por Lobo
revisão: Cecília Aiko Motoyama Martins de Oliveira


CAPÍTULO 1

COMO TUDO COMEÇOU
Oi, o meu nome é LOBO, mas podem me chamar de Bélio, que é o nome que eu mais gosto e atendo melhor.

Eu sou um lindo SRD, com uma pinta indiscutível de Pastor Alemão, e vou contar minha história para vocês.


Tudo começou em um dia lindo, quando eu nasci e minha mamãe me lambeu inteirinho... Essa parte é tão comum, que vou até pular, afinal, ninguém quer ler o que já sabe, não é mesmo?


Pois a minha vidinha mesmo começa quando fui adotado por um rapaz muito bravo, que queria que eu fosse bravo também, para proteger a casa dele. Bom, bravo eu sou mesmo, mas ele me batia muito, eu comia pouco e puxa vida! Como a vida parecia bonita lá fora... Eu ficava grudado no portão de casa, e vinham outros cachorros e contavam tudo o que acontecia por essas ruas, e eu ficava doidinho de vontade de sair. Eu era um adolescente, ora essa, quem é que nunca foi adolescente e sentiu vontade de curtir a brisa no rosto, a sensação plena de liberdade, a doçura do sol que aquece as manhãs... E foi num dia assim, cheio de sol e de brisa suave que eu resolvi sair de casa. Fugi mesmo. O meu dono gritou, correu atrás, mas não adiantou: eu já era um adolescente forte e rápido, e queria muito me divertir. Mamãe diz até hoje que quando eu coloco alguma coisa na cabeça, nada me faz desistir, e é verdade. E naquele dia, eu tinha decidido que não ficaria naquela casa nem um dia mais. Fugi. Corri como o vento. Alguns carros tentaram me pegar, mas eu era mais rápido, mais esperto, mais ágil que eles. Escapei por pouco várias vezes, e se a mamãe algum dia ler isto, vai ficar com o coração na mão, só de saber quantas vezes estive perto de ser atropelado. Mas a Vida falava mais alto, e eu segui em frente, correndo, sentindo o sol, a brisa, o vento, a felicidade me inundando...


E veio a noite. A primeira fora de casa. Pensa que eu fiquei com medo? Fiquei nada! Eu era grande, um gigante! Era forte, nada podia comigo. A noite estava fresca, não era frio, nem muito calor, era só encontrar um canto para me encostar. Aí eu me lembrei: meu estômago doía... Eu tinha fome! Muita fome! Na emoção do dia, tinha me esquecido de comer... E na pressa de fugir de casa, não tinha sequer embrulhado um lanchinho para mim... Nossa, como isso era terrível! Comecei a andar à toa, devagar, farejando, procurando o que comer. Cheguei a sentir saudade do meu dono, aquele que me batia, mas me dava comida. Tentei voltar para casa, mas o caminho já não era conhecido, não consegui me orientar. Resolvi dormir num canto, quem sabe a fome não passasse, e amanhã...


Acordei com mais fome ainda. Tentei procurar alguma mão amiga, mas as pessoas tinham medo de mim. Fui ficando cada vez com mais fome, e já não sabia o que fazer. Foi aí que eu vi o Mike. Ele era um vira-lata de rua, nunca tinha tido dono, conhecia as ruas desde que tinha nascido. Eu já tinha feito amizade com ele no portão de casa, e agora estava entre amigos! Com ele eu aprendi a fuçar o lixo, a rasgar os sacos à procura de um bom pedaço de frango, a comer daquilo que caía no chão. Era muito ruim, às vezes eu ficava com dor de barriga, e comia matinhos para ajudar a acalmar a dor, mas a liberdade valia isso... Andei muito, corri bastante, conheci algumas cadelinhas fantásticas (mas isso eu não vou contar não, vai que a mamãe lê isso, é melhor eu deixar esses segredos guardados...). Mas fui começando a me cansar dessa vida de boêmio. Comecei a ver que alguns cachorrinhos tinham casa, comiam bem, eram bem tratados, tinham até carinho... Mas quem é que ia querer um cachorro grande como eu? Geralmente as pessoas procuram filhotinhos, engraçadinhos, de raça pura, vendidos a preços exorbitantes... e eu era só um cachorro de rua, um cão sem dono, sem eira nem beira...
CAPÍTULO 2UM DIA MUITO ESPECIAL

Eu já estava nas ruas havia algum tempo, meio sem destino, e já tinha me acostumado a ver as pessoas fugindo de mim, algumas me jogavam pedras para que eu me afastasse, e cachorrinhos esnobes passeando na coleira com seus donos, cheios de si, me provocando à distância. Eu não ligava muito, afinal, eu é que tinha escolhido essa vida... Já não me parecia tão boa, mas o que é que eu ia fazer?


Foi então que uma noite veio aquele cãozinho idiota. Já fazia alguns dias que ele passava por mim me provocando, mas aquela noite eu não ia deixar barato. Esperei na esquina, eu sabia que mais cedo ou mais tarde ele iria passar por ali. E quando ele passou por mim, me provocando, eu ataquei. Ele era muito menor, mas valente, e tentou se defender. Eu ia acabar com ele ali mesmo, quem ele pensava que era, me provocando assim, todos os dias, me xingando, achando que era o dono da rua? A rua era minha, e não dele, aquele pequeno monte de pelos de coleira... Ah, foi uma briga das boas, mas o dono dele estava lá, e logo encontrou um pedaço de pau para me bater e me afastar. Apanhei muito, não teve jeito... Tive que fugir. Com o corpo todo dolorido, fui andando. A noite estava boa, mas eu já nem sentia, estava cansado e dolorido. Queria encontrar um canto. Mas algo me dizia que minha vida solitária estava por terminar. Continuei vagando por aqueles quarteirões desertos até ver o dia clarear. Sabia que o pequeno monte de pelos morava ali por perto, e portanto eu não podia parar em qualquer lugar. Ele poderia me encontrar e se vingar enquanto eu estivesse dormindo.


Então, avistei aquela casa. Estava com a garagem aberta, e tinha um carro lá. O carro estava quietinho, achei que poderia ficar escondido ali. O silêncio da casa dizia que todos dormiam. Resolvi entrar, mesmo sabendo os riscos que corria. Deitei atrás do carro, e adormeci profundamente. Sonhei com lugares lindos, campos verdes, uma mão gostosa me acariciando, senti saudades da minha mamãe, aquela que primeiro me viu. Ela me amava, ela saberia cuidar de mim... Droga, como eu me arrependi de ter fugido! Acordei com um homem alto passando perto de mim. Levei o maior susto, achei que ele fosse me bater. Rosnei o mais bravo que pude, mas acho que ele percebeu que eu estava mais assustado do que bravo, e falou manso comigo. Ele chamou um monte de gente lá de dentro da casa, e todo mundo foi me ver. Aí, ele tirou o carro, e eu vi que a garagem era grande. Eles fecharam o portão. Será que eles iam me trancar, me bater? Eu estava pronto a me defender a qualquer preço, custasse o que custasse.


Veio uma mulher, com cara de boazinha. Ela estava com medo, pude ver em seus olhos. Mas mesmo assim chegou perto de mim, falou baixinho. Me chamou, passou a mão na minha cabeça. E trouxe um prato, com leite e pão. Nossa, como eu tinha saudades desse gosto. Era uma delícia. E depois veio outro prato. Eram restos, como eu comia na rua, mas muito mais gostosos. Não eram como os restos que eu costumava comer, com gosto meio azedo, que me davam dor de barriga. Eles tinham gosto gostoso, sabor de verdade...


Comi tudo. Aí senti o cansaço bater mesmo. Fui me deitar no fundo da garagem. Dessa vez, nem sonhei. Estava tão cansado, tão triste... Sabia que mais cedo ou mais tarde teria que sair por aí, voltar à minha vida na rua. E à noite, o portão ficou aberto para eu sair. E eu entendi que tinha que ir embora. E fui.


Mas ainda estava machucado, então não fui longe. Andei um pouco, mas a solidão veio, a tristeza e o medo, pela primeira vez, chegaram perto de mim. E eu voltei para aquela casa. Quem sabe o portão ainda estivesse aberto? Quem sabe eles me quisessem por lá?


Mas o portão estava fechado. Cansado, cheio de dores, dormi ali mesmo, na frente do portão, vendo a casa lá dentro cheia de gente, felizes, acho que já tinham me esquecido. Dormi, um sono profundo, pesado, sem sonhos.


Acordei assustado, com pessoas falando alto perto de mim. Será que estavam tentando me capturar? Será que eu ia ser pego? Me levantei rápido, ainda meio atordoado de sono, procurando me defender.


Não era nada disso; o portão estava se abrindo. Eram as crianças, pratinho com leite e pão. Café da manhã!!! Era sorte demais para um cachorro como eu. Uma mão pequena em mim, me afagando, delícias que eu não conhecia...


Nesse dia, fiquei dentro do portão, com as crianças sempre me visitando, passando a mão em mim. Traziam comida, e viram que eu estava machucado. Trouxeram um homem grande de branco para me ver. Fiquei com muito medo. O Mike já tinha me avisado que o Homem de Branco é aquele que leva a gente embora e nunca mais traz de volta. Fiquei ressabiado. Ele pôs a mão em mim, me examinou inteirinho, falou muito com as pessoas do portão. Eles saíram, mas voltaram com umas coisas para passar nos meus machucados. Doíam, mas eu nem podia reclamar. Eles pareciam tão bons, acho que não iam me maltratar. Ainda essa noite o portão ficou aberto. Saí de novo, mas alguma coisa dentro do meu peito me fez voltar. E dormi dentro do portão. Acho que alguma coisa ia acontecer...

CAPÍTULO 3UMA FAMÍLIA, ENFIM!

E o tempo passou. Aquela família me adotou de vez. Cuidaram de mim, me trataram como um rei. Ganhei comida, carinho, conforto, nome! Agora eu tinha um nome! Eu era o Lobo, o protetor da casa. Eu tinha um dever a cumprir! Eu tinha que proteger a minha família. Agora eu tinha a Mamãe, o Papai, o André, o Fábio, a Cecília. Eu tinha uma responsabilidade enorme, mas valia a pena. Eu tinha carinho, amor, coisas que eu nunca tinha visto antes. Dormia protegido, passeava pela casa.


Ganhei amigos, amigos diferentes, humanos, que adoram passar a mão em mim, falar comigo, me acariciar. O Mike às vezes passa por aqui, fica admirado da mudança. Ele já está velho, acho que logo vai embora. Ele nunca quis fazer a troca que eu fiz.


Fiquei maior um pouquinho, claro, comendo bem, só podia crescer mesmo. Meu pelo ficou maravilhoso, e aquele cãozinho idiota mora aqui perto, e continua passando em frente da minha casa de vez em quando. Eu não gosto nadinha dele, mas aqui ele não entra. E se tentar, ele vai ver só!


Mas às vezes eu penso que não deveria ter raiva dele assim, pois foi por causa dele que eu encontrei minha família, que eu vim parar aqui...


Aqui eu tenho tudo o que eu já tinha ouvido falar em histórias na rua, pratinhos cheios de comidinha, ração na hora certa, beijinhos no fuço, escovação, às vezes dormir dentro de casa (só quando o Papai se distrai, e a minha maior cúmplice para isso, a Cecília, deixa...). Biscoitos de montão (rapaz, esses são gostosos mesmo, acho que eu poderia comer uma caixa inteira deles), algumas frutas (eu não sou muito chegado, ainda bem que ninguém me obriga a comer o que eu não gosto!), de vez em quando um leitinho aguado (lembra daquele moço de branco, então, o nome dele é Tio André Veterinário – que nome comprido, né, o meu é bem mais legal –, pois ele disse que eu só posso tomar leite com bastante água, para não me deixar com dor de barriga), pão (putz! Esse aí é bom demais!!!!), e sempre que as crianças deixam, a Mamãe me dá alguma guloseima depois da janta. Mais que isso, eu vou passear todos os dias (geralmente com o Papai) à noite. A única coisa que o Papai não entende é que eu preciso andar logo, cheirar tudo, e ele fica me segurando com aquela corrente, eu puxo mesmo! Quem sabe assim ele solta. Sabe que eu nunca perdi a minha veia boêmia, e de vez em quando eu até tento escapar, mas não resisto, volto sempre...


Aprendi um montão de coisas, principalmente que para viver em casa a gente precisa ter algumas regras, como não pegar comida da mesa, sentar para esperar a comida, a dar a patinha, deitar, sentar na cadeira...


Aprendi a mostrar direitinho para todos aqui em casa o que eu quero; no começo foi difícil, eu falava, falava, e ninguém me entendia. Mas aos poucos a gente foi entrando numa sintonia legal, e hoje, a gente se entende às mil maravilhas.


Depois que eu me acomodei vivi ainda muitas aventuras, aprontei umas poucas e boas, e vou contar todas para vocês.


Mas não agora. Agora eu tenho que tomar meu café da tarde. E cochilar ao sol depois. E tirar uma soneca no sofá com a Mamãe. Quem sabe amanhã...

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